terça-feira, 20 de novembro de 2012

Essa é minha vida, esse não é meu mundo!

É duro viver em um mundo materialista. Eu, que sempre fui desapegada de bens materiais, começo a bater de frente de forma mais traumática com essa realidade. Na verdade, nunca fui tão apegada a certos bens porque não os tinha, na maioria das vezes. Ao invés de ficar sofrendo por não ter uma roupa da moda, por não ter aquele aparelhinho eletrônico, por não ter os produtos de beleza que as outras meninas tinham, eu relaxei e fui tocando a vida. E Isso na adolescência, ou seja, não foi tão fácil assim! Mas já que meus pais não podiam comprar os produtos da moda, eu nada podia fazer a não ser aceitar esta situação.

É duro também viver em um mundo individualista. Aliás, não sei o que vem primeiro: o materialismo ou o individualismo! Sobre este último, digo que assim como a grande maioria dos jovens, cresci pensando que em algum dia, eu ia poder ter uma vida bacana e ter aquilo tudo que eu não pude ter nos anos anteriores, isso fruto de muito estudo e trabalho. Pra começar, eu teria que entrar numa universidade pública (e gratuita principalmente!), pois senão nem faculdade eu teria. Isso não foi  problema, entrei. E talvez tenha escolhido um curso onde o individualismo é determinante. Arquitetura é o lugar dos “meus projetos”, da “minha ideia”, do meu “processo criativo”. Talvez outros cursos também assim sejam, pois ao fim tem-se um profissional de caráter majoritariamente autônomo. Eu sempre tive certeza de que eu precisava me bastar por mim mesma e isso me gerou uma grande insegurança: sempre achei que eu sabia de menos, que não era suficiente, que em algum momento isso ia ser constatado e por aí vai. O problema é que quando a sua formação tem este caráter individualista, os seus outros colegas nunca demonstram que também têm essa insegurança. Pelo contrário, todos exaltam a sua destreza na primeira oportunidade de se autovangloriar.

E nesta minha jornada de “criar e me criar” no curso de Arquitetura, fui pulando de instituição em instituição, atrás de uma segurança de nome, de fachada, de status, já que pessoalmente eu sempre havia sido um poço de insegurança.  Hoje, não há mais pra onde ir. Cheguei ao lugar mais alto, no céu das vaidades individualistas, onde estão os ditos detentores da verdade e os formadores de opinião. E isso nada me traz em segurança, pelo contrário, me sinto impelida a ser cada vez mais bem informada, cada vez mais cheia de ideias, cada vez mais inteligente. Ou eu seguia essa jornada individualista, quase narcisista, ou ficaria rapidamente para trás. É aquela velha máxima: Quanto mais alto, maior o tombo!

Era óbvio que eu não conseguiria. Talvez nem eu tenha tido a consciência do tamanho da encrenca em que eu estava me metendo. E, sim, só quando acontece de fato o tombo e quando começamos a ver a cor do fundo do poço, é quando realmente também começamos a ver a reta final desta jornada. E isso não é nada fácil. Não tem sido, aliás. Mas quando se vê a tal reta final, é chegada a hora de pegar um atalho. Pensei em mil atalhos, e continuo pensando. Se na estrada original, as dúvidas já são muitas, imagine num atalho! Mas o bom de ter poucas certezas é saber que é nelas que você tem que se apegar. Não tem jeito, são suas únicas certezas!

E talvez a minha certeza mais evidente seja que eu não nasci para este mundo individualista! Estou há quase 15 anos tentando entrar nele e talvez por isso eu não tenha conseguido me estabilizar. Não é o meu caminho, não é o meu mundo. Sou do coletivo, sou da ajuda mútua, sou da troca, sou do eterno aprendizado. Não quero deter em mim nada que eu não possa compartilhar. Não quero o ego, não quero a realização pessoal, não quero a promoção solitária.

Era pra eu ter escrito uma crônica, ilustrada pelo vídeo abaixo, de onde eu tirei algumas dessas conclusões. Mas, mais uma vez, saiu um desabafo! Espero que o caro leitor possa pelo menos espelhar esse lenga-lenga na sua própria vida. E o vídeo? A minha crítica seria em cima destes comerciais da Nextel para a TV, onde alguns fazem uma apologia intimidadora ao sucesso pessoal. Roteiro básico: “Eu me dei mal, eu não tinha nada, eu era um zé-ninguém e hoje sou o que o sou. Nextel, esse é meu mundo!” Me diga se isso não é cansativo só de assistir?! O vídeo abaixo não é um desses com uma figura “ilustre” em especifico. Escolhi este vídeo mais geral, porque nele o roteiro inclui um “não é dinheiro, não é fama, não é carreira, não é poder”, como que para se retratar do caráter puramente individualista dos demais, mas acho que não conseguiu. Porque a partir do momento que o roteiro inclui um cadeirante numa trama de caminhos conectados por escadas, está me dizendo outra coisa além do que escuto: Por mais longe que consigamos chegar, por mais autossuficiente que pareçamos ser, por mais autônomos que possamos viver, sempre é chagada a hora de seguir em frente com a ajuda, com a troca, com a generosidade. Esse é meu mundo!


sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Infidelidade e outras drogas

Acabo de ver um filme que transita em torno do tema da infidelidade. Sim, ela mesma: traição! E me diga, caro leitor, se você já não perdeu algumas boas noites de sono por conta desta bendita palavra? Ou então, se já se viu inquieto por conta das outras palavrinhas derivadas da infidelidade? Que tal desconfiança? Conhece, caro leitor? Já sentiu na pele a dor aguda que é desconfiar da pessoa mais íntima da sua vida? Como dizem por aí: Quem nunca?

O filme a que me refiro chama-se Last Night, aqui traduzido por A Última Noite. Aliás, eu sou a favor de tradução literal dos títulos de filmes estrangeiros, salvo raríssimas exceções. Em resumo, o filme retrata pouco mais de 24 horas da vida de um casal, quando ambos se deparam com aquele momento crucial do “trair ou não trair”. Como uma boa ficção, na mesma noite e em cidades diferentes, tanto a mulher quanto o marido estão chegando naquela situação limite de dar um passo à frente e sucumbir à tentação, ou resistir e voltar à sua vida monogâmica no dia seguinte.


Não vou aqui contar o desenrolar da trama, mas vou contar o final. Sim, posso contar o final porque na verdade não existe um final! Todo o drama acontece durante a bendita noite de tentações, mas o que me prendeu depois do fato consumado (ou não consumado), foi saber o que o casal faria ao reencontrar-se pela manhã. E aí nada acontece, porque eles trocam algumas palavras, se olham desconfiados e o filme termina! Claro, não poderia ser de outro jeito... O filme concentra sua tensão no ato de sucumbir ou não à traição. O dia seguinte, literalmente, é outra história, literalmente também.

Mas aqui eu concentro a minha reflexão pós-filme: no dia seguinte. Seja lá o que for o conceito de trair, sempre haverá o dia seguinte. Falo isso porque para alguns, trair é o ato sexual consumado; para outros, o fato de querer estar com outra pessoa já é uma traição em si; ou mesmo um meio-termo, um beijo apaixonado, seria já o ato consumado para outros também. Independente do que cada um formule, o dia vai amanhecer e você terá que olhar seu amado nos olhos. E aqui eu concentro mais ainda: Confessar? Você confessaria uma traição? Ou guardar para si? Cair em si e guardar só para você o seu ato irresponsável?

Talvez a pergunta seja outra: O que você espera do dia seguinte de uma traição? Ser sincero com o outro e ser perdoado ou fazer sua auto-amnésia e esquecer dentro de si a noite passada? Aqui o caro leitor já percebeu que este texto está muito mais para um desabafo pessoal do que para uma crítica de filme. Talvez por isso eu tenha, no início deste texto, chamado o meu caro leitor para um questionamento próprio, justamente para me encorajar a refletir sobre as minhas próprias histórias.

Sim, já fui traída. Sim, já fui a outra. Não, nunca traí um namorado. Nunca tive que me deparar com o dia seguinte e olhar nos olhos de alguém com a dúvida sobre assumir ou não uma traição. Mas imagino que eu não contaria. Se eu o amasse de verdade, não contaria absolutamente nada! O erro seria meu, a injustiça teria sido minha, o proveito teria sido só meu. Porque raios então eu teria que compartilhar a traição, compartilhar a minha dor do dia seguinte com ele, à espera de um ato desesperado de perdão? Sim, porque alguém que perdoa uma traição só pode estar emocionalmente desesperado e não é justo colocar uma pessoa nesta situação, de perdoar ou não, sendo que ela ama e quer ficar junto da outra pessoa. Como é difícil encarar a traição assumida como o fim e resistir a um pedido de perdão... Digo que é quase impossível.

E por fim, o caro leitor já vislumbrou nas últimas palavras o meu ato confesso: a tentativa frustrada de perdoar uma traição. Como eu disse, foi quase impossível resistir ao pedido de perdão, vindo da pessoa que talvez tenha sido a única oportunidade que eu tive de amar e ser amada em mesmo tom e intensidade. Eu tinha que tentar perdoar. Mas no fundo eu sabia que não iria conseguir... Pena ter demorado tantos anos pra ter certeza. Ao final, só tive uma certeza: Ele não deveria ter me contado absolutamente nada!

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Impressionismo e Van Gogh

A grande exposição do ano, sem dúvida, já é a mostra Impressionismo: Paris e a Modernidade - Obras-Primas do Acervo do Museu d’Orsay, que acontece atualmente no CCBB-SP e em outubro já estará no CCBB-RJ. Hoje finalmente consegui visitá-la, ainda que enfrentando uma caprichosa fila na entrada. Nada comparado ao sábado último, quando me aventurei até o centro de São Paulo e pude constatar o que é uma fila de exposição blockbuster nos fins de semana! Os paulistanos (e os forasteiros e visitantes também, não?) estão de parabéns pela paciência e vontade para enfrentar uma enorme fila, neste pseudo-verão que se instalou momentaneamente em São Paulo, para então conferir os ditos impressionistas. E o CCBB também está de parabéns, por viabilizar uma mostra de tal magnitude a custo zero para o visitante! Daí justifica-se a fila, a mais justa e gratificante fila!

Pois bem, consegui entrar às 20h no CCBB e pude contemplar as obras por apenas duas horas. Não, apenas duas horas não são suficientes para observar texturas, nuances, gestos, cores e tudo mais das telas de Manet, Renoir, Pissaro, Monet, Degas, Cézanne, Gauguin e tantos outros, “mais impressionistas” ou “menos impressionistas”.  A exposição ocupa quatro andares do CCBB, que apesar de todos os esforços expográficos, é sempre um local difícil para se trabalhar uma exposição. Os núcleos estipulados pela curadoria começam em uma sala e terminam em outra sala, só que em outro andar! Os painéis gráficos de introdução de cada núcleo são obrigados a repetir-se pelo espaço expositivo,  fazendo a ligação do que ficou no andar anterior com o andar seguinte. Mas a arquitetura eclética e muito bem conservada do edifício do CCBB, que nos é apresentada ao sair de uma sala para então descer as escadas e entrar na próxima sala, compensa qualquer dificuldade em acompanhar o pensamento curatorial da mostra.

Deixando o papo crítico de lado, voltemos à contemplação das telas. Como eu disse, duas horas não foram suficientes para tanta curiosidade e admiração. Posso chutar que são umas 50 obras, nenhuma passível de ser “pulada”, daí o caro leitor já imagina o quanto de tempo deve reservar para este passeio pela Paris do fim do século XIX e início do século XX. E reserve também um arsenal de “desculpa!”, porque possivelmente você irá dizer esta palavrinha a cada 5 minutos, toda vez que esbarrar no visitante do seu lado. Sugiro também preparar o ouvido e a paciência, para escutar coisas do tipo “O Rio Sena é bem mais bonito ao vivo”, “Nossa, quando eu subi na Torre Eiffel, não imaginava que ela fosse construída para uma exposição ao ar livre!” ou ainda “Que castelo lindo!”, referindo-se à Catedral de Notre Dame (Sim, eu ouvi isso de uma visitante).

Mas eis que então, surge o guardinha do CCBB e nos lembra de que faltam apenas 7 minutos para encerrar a visitação, e eu, ainda na metade da última sala! Mesmo sabendo que eu iria voltar a ver estas obras na remontagem da mostra no CCBB-RJ, eu não teria a mínima condição de sair daquele lugar sem antes ver de perto a única tela ali exibida de Vincent Van Gogh. Não lembro se já comentei aqui nas entrelinhas do Entre Esquinas, mas Van Gogh é certamente meu pintor favorito! Como pintor e como alma angustiada, inquieta, inapreensível. Li a biografia dele há alguns meses e talvez ainda não tenha me recuperado do exercício terapêutico que foi estudar a fundo a alma deste cara (Sou carioca... Posso chamar o Van Gogh de ‘cara’!). E ali estava eu, bem nas telas de Gauguin, observando paulatinamente a tão famosa luz das telas dele, quando ouço o toque de recolher do guardinha. Minha mente se esquivou de Gauguin e eu girei em torno de mim mesma, fazendo uma tomada geral da sala, à procura daquele “filho único de mãe solteira” que o Museu D’Orsay disponibilizou para vir ao Brasil, dentre tantas outras obras de Van Gogh que o museu possui.  Achei. Ali, logo depois da seqüência do Gauguin.

O vidro (que protege a grande maioria das pinturas) deixa a tela um pouco nivelada demais, brilhosa, distante. Mas estava ali, um Van Gogh de Arles, de 1888 se não me engano, à época da estadia de Gauguin na famosa casa amarela. Com certeza não é um Van Gogh pleno, maduro, autônomo. Era uma obra de Van Gogh na sombra de Gauguin, daquele período tão conturbado da sua vida e mergulhado naquela amizade que talvez seja a mais intrigante de toda a história da arte. A legenda da tela resumia que Van Gogh copiou “escrupulosamente” a técnica de Gauguin... Escrupulosamente... Passei os últimos 5 minutos dentro daquela sala lamentando a injustiça, a covardia, a superficialidade com que Van Gogh foi tratado nesta exposição.  Ok, sou fã do cara, talvez eu esteja exagerando, mas confesso que saí profundamente decepcionada. Eu já sabia que só teria uma única tela de Van Gogh, mas não sabia que ele seria tratado como um desdobramento “escrupuloso” de Gauguin. Para não lamentar muito, vou entender que Van Gogh seja um desdobramento do Impressionismo, que ali se inspirou, mas que ali não ficou. E penso que seja isso mesmo: Van Gogh não teve a devida participação nesta mostra porque é um capítulo à parte do Impressionismo, ou como chamam um “pós-impressionista”. Criou sua própria estética, sua técnica, sua paleta de cores, seu caminho... Seu caminho entre corvos. Não sei quais motivos regeram a escolha da curadoria do Museu D’Orsay de incluir apenas um Van Gogh, mas talvez a peculiaridade tão densa do pintor holandês não coubesse na pluralidade desta mostra coletiva. Vou entender desta forma.

Mas ainda assim, na solitária tela 'La salle de danse à Arles', estavam o azul e o amarelo da sua paleta, suas cores que exprimiam a alegria e a vivacidade. E com umas pinceladas com o vermelho e o verde, mais ao fundo, suas cores ligadas à tristeza e à morte. Em termos de cores, um Van Gogh completo! Por fim, escuto de um visitante: “Morreu com apenas 47 anos!” e não hesitei em corrigi-lo imediatamente: “30 e 7 anos! Apenas 37 anos”.

La salle de danse à Arles, Vincent Van Gogh.

domingo, 5 de agosto de 2012

A arte de "googlear"

Há um bom tempo, um amigo fez um protesto no Facebook, onde questionava o porquê de quase ninguém mais dos seus amigos frequentar a sua casa, o porquê de ninguém mais se reunir no boteco da esquina para trocar ideia descompromissada e por aí vai, tudo substituído pelo contato apenas virtual da amizade. De todas as reclamações da revolta “internética” do meu amigo, o que mais me chamou atenção, foi quando ele finalizou: “E ninguém mais tira dúvida com ninguém! Ninguém mais me pergunta nada! O Google substituiu tudo isso.” Grande sacada do amigo! Eu nunca havia parado pra pensar nisso, mas é uma grande verdade da nossa atualidade. E espelhei esta afirmação diretamente em mim, pois é justamente o que mais faço quando surge uma dúvida de ortografia ao escrever, uma dúvida sobre algum personagem qualquer (Viva o Wikipédia também!) ou mesmo para saber quais são os títulos do meu clube de futebol ao longo da sua história... Afinal, são muitos os títulos do Flamengo e só o Google para me esclarecer!

Brincadeiras à parte, esta constatação me faz pensar como nos tornarmos autossuficientes nestes termos (O revisor do Word me corrigiu! Eu escrevi ‘auto-suficientes’... E agora? Não, não vou ‘googlear’ para saber qual é a versão correta!) e também me faz lembrar de como nos obrigamos a sermos cada vez mais detentores da informação, da mais útil à informação mais insignificante. Sabemos um pouco de tudo e quase nada de algo específico. Formamos hoje uma sociedade do pitaco! Todos tem sua opiniãozinha sobre qualquer assunto da mesa de bar, da sala de aula, da hora do almoço do expediente... E como tudo hoje em dia, ai de quem não compartilhar a enorme contribuição da sua opiniãozinha. E daí vem outro e rebate com sua outra opiniãozinha controversa, que instiga um círculo vicioso de “achismos” e de “mas eu li isso na internet”. Haja paciência e cerveja gelada para me segurar nesta mesa de bar!

E quando nos deparamos com a falha grave de não termos “googleado” aquele assunto do momento e nos vemos em plena mesa de bar, perante nossos amigos e sem saber uma vírgula para dar o nosso precioso pitaco, aí eu lembro o meu amigo facebookiano e digo que ninguém mais tem coragem suficiente (como se precisasse de coragem!) pra assumir sua ignorância momentânea. Seria a hora de pedir licença e dar aquela “googleada” básica no banheiro pelo smartphone? Não duvido.

Na verdade me lembrei desse post e cá estou esticando o assunto, porque uma grande dúvida paira sobre o meu ser nestes últimos dias e, por incrível que pareça, não joguei a dúvida no Google! Pois vos digo: Estamos em meio às Olimpíadas de Londres, assistindo o que dá pra assistir na telinha e torcendo (Pero no mucho!) para quem veste a camisa canarinho da sua modalidade. Só que sempre que o vídeo corta para a imagem do logotipo das Olimpíadas de Londres 2012, eu me pergunto: O que é isso? Em que este logotipo se associa à Londres? Isto mais parece um ideograma japonês, chinês ou coisa do tipo!

E aqui estou eu, caro leitor, assistindo às disputas interessantíssimas de esgrima e pólo aquático, mas infelizmente não tenho abstração intelectual suficiente para entender este logotipo londrino. Tenho certeza que o Google sabe... Ah, sabe! Mas vou na onda do meu amigo revoltado e vou deixar a dúvida no ar. Não estamos numa mesa de bar, mas quem quiser me esclarecer, fique à vontade!

Eis a questão!

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Vaga, não vazia.

Eu não sou fumante, mas fumo.  Cigarro é sempre companhia pra alguma coisa, principalmente para um copo de cerveja, mas essencialmente para uma porção de solidão. Eu digo que fumo porque não tenho celular (Não tenho mesmo, viu! Nem adianta pedir meu número!), fumo porque preciso ter alguma coisa nas mãos quando estou sozinha no ponto de ônibus, fumo porque preciso de desculpa pra ir pra fora do bar no intervalo do jogo do Flamengo, fumo porque tenho braços longuíssimos e não fico bem sem nada nas mãos. Vejo todos com os seus celulares touch, olhando pra baixo, ensimesmado em si mesmo, mas eu olho por cima e olho pra todos, com o cigarro entre os dedos. Na maioria das vezes, o cigarro queima por si só, solitário como eu.

E aqui, na madrugada, que não é um intervalo de tempo e sim um lugar, eu fumo meu cigarrinho na varanda, sozinha dos outros e cheia de mim. Na companhia do cigarro, além de mim, tem sempre uma coisinha. Ou ao contraio. Já falei isso. Às vezes, além de mim (De novo!), tem um copo de coca-cola, pra não me deixar sentir o gosto ruim do cigarro. Fumar com coca-cola me faz lembrar da adolescência. Ninguém aguenta o gosto do cigarro com 15 anos, e nem o gosto da cerveja, ainda. Eu tinha uma amiga que ia até a minha casa, roubava um cigarro da minha mãe, e voltava pra casa dela pra fumar aquele Palace longo, filtro branco. Eca! Eu só ficava ali perto, vendo o quanto que ela era descolada, moderna, corajosa. Eu sempre fui mais chegada à galera dark, hard core, mas sempre fui careta. Eu sentava no fundo da sala de aula, não enxergava o que estava escrito no quadro negro, copiava de quem conseguia enxergar, mas sempre fui a melhor aluna da sala no 2º grau. Sem estudar em casa, só ali na sala de aula.

Voltando à minha amiga descolada, naquela mesma época, eu namorei um rapaz que era ex boy dela. Sim, ele andava rodeando ela e acabou com a amiga caretinha. Durou 1 ano! My first boy! Formamos um belo triângulo amoroso: Terminamos nosso namoro caretinha, ele voltou para ela, que havia terminado um noivado (Não disse que ela era moderna!) por causa do meu ex boy e por aí vai. Não posso contar mais detalhes comprometedores. Mas daí, eis que os dois pombinhos estão casados atualmente. Casadíssimos mesmo! 

Mas porque o caro leitor teria interesse nas minhas fofocas de adolescência? Por motivo nenhum! Só lembrei da colega de 2º grau enquanto fumava há pouco, sentindo essa brisa fria e boa de São Paulo. Lembrei que eu poderia estar no lugar dela, ela no meu, eu com família, ela solitária. Eu com o ex, ela sendo ex do marido... Que louco! O que seria a vida sem o desvio das nossas escolhas e das nossas negações? O que seria? Pequenos detalhes, decisões pontuais e nem sempre muito bem articuladas. Tomar decisão, taí uma coisa para a qual eu não levo jeito! E nem falo do ex boy, viu! Depois que o namoro terminou, nos idos de 1900 e bolinha, eu lembro de ter desviado minhas preocupações e angústias para o então enigmático vestibular. Fui encarar a fera. Escolhi o caminho e atirei. Mas como eu falei, meu caro leitor, não sou boa para decisões. Eu decido e fecho os olhos, sigo confiando no faro, porque se eu olhar para os lados, a dúvida reina e a decisão vai pelo ralo...  

Mas a dúvida está sempre ali, bem do lado, bem próxima da certeza. E não estou falando do ex boy, novamente! Estou falando de... Ah, deixa pra outro post! Estou muito vaga hoje... Vaga, mas não vazia.

Foto vaga para um post vago? Pôr-do-sol e o Complexo do Alemão. Vagamente me lembram alguma coisa...

terça-feira, 17 de julho de 2012

Tempo de decisões

"Refletir é o mesmo que erigir casas. Quanto mais eu conheço os vocabulários humanos, quanto mais eu mergulho no mistério dos significados, muito mais eu construo casas para abrigar minhas angústias. A palavra é um socorro à alma humana (...). A obra escrita com sensibilidade e arte funciona como teto onde protegemos nossa nudez, onde encontramos abrigo para descansar nossas indigências."                           Tempo de Esperas, Padre Fábio de Melo

No micro-post anterior, eu expus aqui a minha fragilidade criativa frente às oscilações da vida, quero dizer, o quanto eu fico inerte quando estou em uma crise existencial e o quão pouco escrevo sobre os fatos e sentimentos que povoam esta crise, ainda que eu reflita muito sobre isto. E como reflito!

Tive a grata surpresa de tomar para mim este livro do Padre Fábio de Melo, que há alguns anos eu já o queria ler, e perceber que nele seguem alguns temas muitos atuais para mim. É um livro de trocas de cartas entre professor e aluno, estou saboreando-as aos poucos, ainda estou na 3ª correspondência, mas tão cedo este padre abençoado já me deu coragem para parar e refletir. Refletir aqui, em palavras. 

Coincidentemente, hoje eu fui até o meu lar dos últimos anos – a FAU USP – para tomar algumas decisões sobre minha vidinha profissional. Decisões tomadas (ou nem tanto!), fiquei vagando por alguns minutos pela faculdade, fria e deserta como em todo julho, e a única luz de vida veio da biblioteca, clara e colorida. Fui direto me refugiar entre os livros, em busca de uma voz, um conselho, um olhar, uma conexão... Nada físico, mas tudo no campo do escrito, e não menos real.

Já não é a primeira vez que assim acontece. Se estou aflita, angustiada, tensa, desvio e entro numa livraria em pleno horário do expediente. Às vezes, no centro de São Paulo, erro o caminho e entro num sebo de livros. Minha rinite nem sempre agradece, mas meu espírito me dá um tchau e sai em busca de qualquer outra coisa que não seja a realidade daquele dia.

Hoje na biblioteca da FAU, me enveredei na seção de Antropologia. Separei um Lévi-Strauss pra trazer para casa, mas a mocinha do atendimento – que há alguns anos já me chama pelo nome e não duvido que em breve me chamará pelo apelido – me disse gentilmente: "Mariana, já encerramos e a retirada é até 15 minutos antes do encerramento". Deixei o livrinho do caro professor francês (Ele é belga, na verdade! Acabei de “googlear”) na minha espera para uma próxima visita, talvez depois de amanhã. Não à toa fiquei por ali, pelas bandas da Antropologia, da Sociologia... Dei um pulo também ali nos bons e velhos urbanistas, em especial naqueles que nos lembram do direito à moradia. Bem ali mesmo, onde o urbanista mete o dedo na ferida e nos acorda para o dever primário de um arquiteto: o dever de promover a moradia nos seus meandros mais periféricos e necessários. Não vou me alongar muito, mas o caro leitor já deve observar por onde me encontrei ali naquela biblioteca e por onde venho querendo me achar na minha vidinha profissional. Pois então, isso é papo mais longo, que me exige uma dose maior de maturação, mas é bem por aí que vou trilhando meu caminho. Quando eu chegar, eu aviso!

Ler e escrever. O Padre Fábio me lembra do quanto é bom externar em palavras os meus anseios. E é isso que preciso fazer mais, sem obrigar o caro leitor a entrar num consultório de terapia, é claro! Mas também ler me abriga, me dá teto, me dá chão. Também ler me coloca numa sala quente e com luz fraquinha, ao lado de gente que nunca vou conhecer de verdade, mas que vão estar ali sempre dando uns bons pitacos na minha vida e no meu caminho. Também ler me parece ocupar um espaço que ficou vazio há 12 anos, quando perdi meu pai, meu principal mentor e conselheiro. Não tenho dúvida de que todos esses professores, escritores, compositores (Sim! Ouvir música também é ler!) fazem uma ligação direta entre mim e meu falecido pai, a quem puxei essa alma curiosa.

Vou continuar a ler as cartas do livro do Padre Fábio, que me ligam a Deus primordialmente, mas não unicamente. Porque aqui está a graça e a benção da escrita deste padre mineiro – fazer ligações espirituais entre todos os nossos pilares da vida. E que Deus os abençoe, abençoe a missão evangélica do Padre Fabio e que também abençoe essa que vos escreve e suas decisões!

Eis a biblioteca e o famoso piso caramelo da FAU USP!


quarta-feira, 6 de junho de 2012

A hora de voltar... a hora de escrever

"Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias. Mas preparado estou para sair discretamente pela saída da porta dos fundos. Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e o desespero. E agora só quereria ter o que eu tivesse sido e não fui."

Queria eu ter o desespero do personagem de Clarice (em A hora da estrela) para me obrigar a sair da rotina de me ser e aqui, neste blog, pelo menos semanalmente ou quinzenalmente, ser o outro, seja lá o que for!

Não, não tenho pretensões romancistas, não possuo tal gabarito, infelizmente. Mas com minhas "pseudo-crônicas" consigo sair de mim, deixar de me ser, enquanto passeio, espio, vagueio pela vida alheia, pela rotina da cidade, pelos contratempos do tempo...

Só quero ter a tranquilidade para aqui poder escrever, refletir, enxergar, re-encaixar os pensamentos do dia, ainda que esteja cansada da rotina de me ser durante todas aquelas horas, como o personagem de Clarice. Falo isto para que, num futuro próximo, eu não queira ter o que eu tivesse sido e não fui, sabendo que escrever, ainda que informalmente, é um desses meus maiores "quereres".

Volto em breve, assim espero!

E pra não perder a viagem, eis aqui "Nome da cidade", obra de Caetano, na voz da irmã Bethânia, inspirada em A hora da Estrela, 'livrinho' do trecho acima, que vem me acompanhando nesses últimos dias. (Sim, eu ainda não o havia lido! Mas vi o filme esses dias... sou fãzoca do Zé Dumont, só por ele já vale!)





segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Sem raça definida

Não é de hoje que eu sinto na pele a visível diferença no modo de vestir-se entre cariocas e paulistas. E não é só nas roupas, mas também, e principalmente, como os moradores das duas cidades lidam com a sensualidade do seu corpo, não entre quatro paredes, mas sim nas calçadas, nos bares, no ônibus e por aí vai.

Um amigo quase-carioca me comentou que, ao se ausentar do Rio, a primeira coisa que ele sente falta é de coxas. Sim, das coxas das moças! Ver coxas, ombros, decotes, aqueles dois dedinhos de cintura das mocinhas é coisa mais que habitual no Rio. Ao passo que, para nós meninas (sim, tenho 30, mas ainda sou menina!), não temos nada tão à vista assim, mas é facílimo identificar os contornos masculinos pelas roupas devidamente ajustadas que os meninos do Rio usam. E assim se faz a fama dos cariocas: moças e rapazes que lidam naturalmente com a sensualidade do seu corpo, sem ser vulgar na maioria das vezes.

Já na terra da garoa... Pois então, aqui o buraco é mais embaixo, a pele é bem menos bronzeada e as roupas são bem mais generosas, assim digamos. Sim, claro, o frio ajuda e muito a aumentar o comprimento dessas roupas e a diminuir a coragem dos paulistanos em se “exibirem”. Menos cores, mais tons de cinza, tecidos menos esvoaçantes... E assim se faz o estigma do paulistano: fechado em casacos, olhar indireto, coxas sob meias-calças, rostos sob densas barbas, decotes sob echarpes. Mesmo no verão, no calor de 30° de São Paulo, quando jogam uma cor discreta nos cinzas e quando os paulistanos sacam do guarda-roupa aquela calça cortada que virou bermuda, mesmo assim nada é tão animador pra quem tem o olhar acostumado aos trajes e corpos cariocas.

Antes que o caro leitor deduza que eu sou uma carioca ultra-sensual, exibida e reclamona, eu digo aqui que, atualmente e depois de cinco anos em terras paulistanas, eu estou mais pra cinza do que pra multicor! A idade avançada (tenho 30 sim, qual o problema?) também não me permite grandes exibições.  Abandonei os shortinhos, as blusinhas tomara-que-caia, o cabelão selvagem, as calças justas de stretch. Mais ainda assim, não consigo ser tão “cinza” quanto os paulistanos. E nem mais tão voluptuosa quanto minhas conterrâneas. Estou ali no meio-termo, no estilo cobertor curto: cobre aqui, mostra ali.

Neste carnaval, tive a constatação do que é estar no meio-termo: Fui à Lapa, à noite, com sandalinhas rosas (odeio rosa! mas só tinha esta cor), um shortinho emprestado de uma prima, cabelinho e franjão arrumados, bem maquiada, bem enfeitada com bijuterias, mas... Sem ombros de fora e sem decote à mostra. Comprei uma camiseta comportada em uma loja de adoção de animais com a frase “Sem Raça Definida”, tecido preto com letras garrafais em branco. Achei interessante usá-la no carnaval. Assim como os vira-latas, também acho que sou uma SRD, meio preta meio branca, meio lisa meio crespa, meio carioca meio paulistana, meio cinza meio colorida. Mas de acordo com parâmetros exibicionistas cariocas, eu estava fora do padrão, e não é interessante estar fora do padrão no Rio. Em São Paulo sim! Em São Paulo é cool ser diferente, não ser convencional. Mas no Rio não. Do alto dos meus 1,85m, cheguei a escutar uma dúvida nos rapazes: “Ela é ele? Ela gosta de meninas?”. Sim, caro leitor, nessa vida a gente escuta de tudo! Mas enfim, foi o preço que eu paguei. Ao invés de lerem “Sem Raça Definida”, os rapazes entenderam “Sem Orientação Sexual Definida”.  Êta limitação de pensamento, hein meninos do Rio!

E antes que meus caros leitores peçam para eu colocar uma foto com o visual daquela noite de carnaval, disponho aqui uma foto da camiseta “Sem Raça Definida” com um conteúdo bem mais interessante do que esta aqui que vos escreve!

Quem quiser adquirir esta camiseta: http://www.naturezaemforma.org.br/

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Doctor Lecter e seus filhos

Gosto muito de filmes. Já vi muita coisa, mas confesso que já vi muito filme ruim, muita porcaria que nos empurram goela abaixo. Hoje sou mais seletiva, chego a recusar convite de amigos pra ir no cinema quando eu sei que o querido vai querer ver a última comédia romântica de Hollywood no Cinemark mais próximo. Esses dias eu conversava com minha irmã sobre o filme “Rio”, animação na verdade, e ela, que viu o filme, disse que gostou e tal. Eu respondi dizendo que não assisti e que tenho preguiça de ver (este é sempre meu argumento para não ver filme blockbuster: tenho preguiça de ver!), além de comentar que o filme me parece um tanto caricato, porque o vilão é um macaco, porque passa a imagem mais do que veiculada de um Rio de Janeiro praiano, vida boa, bossa nova, blá, blá, blá... Ela foi taxativa: me disse que eu tenho que parar de ser cri-cri, reclamona, chata... Talvez ela tenha razão. Ah não! Não mesmo! Morro chata, mas não morro num Cinemark de shopping center!
Mas para os meus caros leitores (Alô, tem alguém aí?) não acharem que eu sou uma nerd cinéfila, vou confessar que sou apenas uma iniciante na arte de apreciar cinema. E ainda tenho muitos filmes pra ver  e os chamados clássicos que eu ainda não vi, confesso! Mês passado, comprei alguns deles: a trilogia do “Poderoso Chefão”, alguns antigos do Scorsese (Adoro! E, assumo, adoro os recentes com o Leo DiCaprio!), uns westerns e... Comprei “O silêncio dos inocentes”. Como eu ainda não tinha visto este filme? Como não? Pois então, fui assistir.
Sentada no grande sofá da sala da casa da minha mãe, no Rio, sozinha, na madrugada... Só eu e o Doctor Lecter. Como dizem aqui em São Paulo: Um puta filme! Sou suspeita para elogiar o Anthony Hopkins. Às vezes eu digo que um ator é ruim porque só faz o papel dele mesmo, sempre com o mesmo jeitão. Exemplo fácil: Sandra Bullock, só faz papel de mulher workaholic, solteirona e desajeitada (e levou o seu Oscar justamente por um papel oposto a isso!). Mas o Hopkins me parece ser o próprio Hannibal! Juro que tenho minhas dúvidas se, de vez em quando, o Hopkins não come uns pedacinhos de carne humana! Brincadeirinha... Ele é um ator de um filme só, aliás, de um personagem só.
Mas voltando ao filme, vou aqui confessar: Não me empolguei tanto. Não estou dizendo que o filme é ruim, longe disso. Falo exatamente de empolgação. Sem sustos, sem gritos, sem aflição... Fiquei frustrada. Mas o filme é bom, realmente bom. E porque eu não estava excitadíssima após a minha sessão caseira de cinema? Achei a resposta: Porque eu não o vi em 1991, claro!
Passaram-se 20 anos apenas, mas hoje são outros tempos, de fato. Imagino eu que em 91 este filme tenha causado todo o rebuliço que eu imaginei sentir, mas hoje, no século seguinte, concordo que o espectador tem que se esforçar para se emocionar com os clássicos de 20, 30 ou 50 anos atrás. E isso é triste! No caso de “O silêncio dos inocentes”, eu logo lembrei da enxurrada de seriados que temos atualmente que tratam justamente do tema abordado neste filme: investigação policial e serial killers. Estes “Criminal Minds” de hoje em dia são todos filhos de Lecter! E a exibição massiva deste gênero, na TV principalmente, acaba por banalizar o tema. Eu mesma faço pouco caso de filmes sobre investigação criminal. Tento lembrar o último que vi e constato que foi justamente um Scorsese, “Shutter Island”, aqui traduzido mal e porcamente como “A Ilha do Medo”, que aliás nem pode-se dizer que é uma investigação criminal sui generis.
E voltando ao filme, novamente, recomendo aos caros leitores (Alô?) se ainda não o viram, que o vejam! Só a cena final clássica, com a Jodie Foster sendo perseguida no escuro, vale muito à pena. Só não recomendo a famigerada continuação da trilogia. Aliás, odeio trilogias! Ah, sou chata mesmo! Já assumi lá na introdução deste texto. Mas tem exceções, é claro, e “O Poderoso Chefão” é uma delas, porque o segundo é melhor que o primeiro... Mas essa resenha fica pra outro post!



sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Reciclemo-nos!

Às vezes eu tenho a nítida impressão de que a vida nada mais é do que uma repetição de acontecimentos, repetidos e maquiados conforme o tempo. Dos mais triviais aos mais curiosos fatos, tudo parece se reciclar ao sabor do tempo. Tudo já aconteceu antes, nada tem uma sensação pura de novidade. Novidade não existe. Tudo é um dejávu constante. Mudam os ares, trocam-se as roupas, a imagem no espelho envelhece, mas tudo gira em torno do mesmo propósito. Aliás, um despropósito, penso eu.

De pseudo-férias no Rio, de volta ao meu bom e velho subúrbio carioca, tenho a sensação de observar o cotidiano dos meus conterrâneos, como se eu estivesse perto e longe ao mesmo tempo. Perto o suficiente para escutá-los, para perceber o seu corre-corre, para apreciar a dinâmica do seu acordar e dormir, mas longe o bastante para não conseguir acompanhá-los. Reconheço na rua, adultos que um dia vi criança, com filhos e rugas de preocupação. Fico consternada com os preços altos dos produtos no mercado, que me lembro de quando ainda era uma generosa mercearia. Ando a pé com minha cachorra pelos bairros vizinhos e ainda consigo ficar consternada com o estado das calçadas, se é que podemos chamar de calçadas apenas uma “lavada” de cimento e pedra, que separa quase que inutilmente o leito da rua e o portão das casas. Quando mais generosas, estas calçadas só servem de estacionamento de carros, de alpendre para as lojinhas e para outras mil utilidades urbanas, menos para a essencial: caminhar. Generosidade urbana não existe no subúrbio carioca. Se o caro leitor quer ter o desprazer de verificar com uma boa caminhada, sugiro a Estrada do Quitungo, avenida que corta os bairros de Brás de Pina, Cordovil e Vista Alegre. É o bom e velho subúrbio, com as mesmas carências de sempre, que tenho certeza, infelizmente, vão continuar sendo as carências de amanhã, apenas recicladas.

Na esquina da minha rua, há um bar de vida efêmera. Minha mãe diz que ali está enterrada uma cabeça de burro (se o caro leitor nunca ouviu, isto é um ditado popular!) e que nada ali dá certo definitivamente. Hoje tivemos uma tão anunciada inauguração do bar, que se não me falha a memória, já havia sido inaugurado ainda este ano! Pois bem, que seja re-re-re-inauguração, mas hoje a noite foi de cantoria e movimento na minha esquina. Por ali já lanchei muitas vezes quando criança, observava os adultos na cervejinha de fim do dia, juntava moedas para comprar um pedaço da melhor torta de chocolate que já comi, reuníamos os primos em torno da minha falecida vó, para saborear uma coca gelada, ainda em garrafas de vidro de 1L, ofertada por ela quando recebia a graninha do INSS. Lembro de um jogo de futebol que assisti na TV que ficava dentro do balcão. Era aquele Brasil e Holanda, que terminou em pênaltis se eu não me engano, semifinal da Copa de 98. Eu tinha 16 anos e vi um jogo de futebol no balcão de um bar e acredito que tenha sido a única “mulher” ali, do lado de fora do balcão! Mas não era qualquer bar... Era na “lojinha”, ali eu tinha permissão para ficar.

E hoje, com outras cores, com outro nome e com outro dono, a “lojinha” como chamávamos lá nos idos dos anos 90, reabriu as portas. Prestigiei o evento, mais de longe do que de perto. Hoje eu não acho que eu tenha permissão para ficar ali. Já estou longe o bastante para não conseguir acompanhar. Prestigiei ao meu jeito, lembrando dos fatos que já vivi por ali e que naturalmente serão vividos por outros agora. A “lojinha” vai ser reciclada, mais uma vez. E duvido que seja a última. Os acontecimentos também ali serão reciclados, ainda que com tortas ruins, coca de garrafa PET e na TV o futebol da atual seleção brasileira, que consegue ser muito mais medíocre do que aquela de 98.

E assim eu sigo nesta vida de reciclagem, me esforçando para não acreditar que tudo isso é um grande caminhão de lixo, me esforçando para enxergar o propósito deste museu de falsas novidades.

“Poucas horas depois, devastado pela vigília, entrou na oficina de Aureliano e perguntou: ‘Que dia é hoje?’ Aureliano lhe respondeu que era terça-feira. ‘É o que eu pensava’, disse José Arcadio Buendía. ‘Mas de repente reparei que continua sendo segunda-feira, como ontem. Olha o céu, olha as begônias. Hoje também é segunda-feira.’ (...) No dia seguinte, quarta-feira, José Arcadio Buendía voltou à oficina. ‘Isto é uma desgraça’, disse. ‘Olha o ar, ouve o zumbido do sol, igualzinho a ontem e anteontem. Hoje também é segunda-feira.’ Na quinta-feira voltou a aparecer com um doloroso aspecto de terra arrasada. ‘A máquina do tempo estragou’, quase soluçou (...)  Passou seis horas examinando as coisas, tentando encontrar uma diferença do aspecto que tiveram no dia anterior, procurando descobrir nelas uma mudança que revelasse o transcurso do tempo. Ficou toda a noite na cama com os olhos abertos, chamando (...) todos os mortos, para que viessem compartilhar de seu desgosto. Mas ninguém acudiu. Na sexta-feira, antes que todos se levantassem,  voltou a observar a aparência da natureza, até que não teve a menor dúvida de que continuava sendo segunda-feira.”
(Cem Anos de Solidão, Gabriel García Márquez)