domingo, 15 de maio de 2011

Sim, estou fugindo de gente "diferenciada"

É curiosamente estranho quando uma situação pontual muda o seu cotidiano e sua forma de pensar sobre um assunto delicado. Pois então, sendo bem direta, fui assaltada na esquina da minha rua há quase um mês. Nada muito traumático, um assalto até leve: não vi arma, o rapaz não foi hostil, não tive grande perda material e, surpreendentemente, minha carteira repleta de documentos foi deixada na biblioteca da FAU USP, duas semanas depois da ocorrência! Graças às preces da minha mãezinha e pela boa menina que sou, Deus está sempre me protegendo das hostilidades desta minha vida metropolitana.

Já passei por apuros bem piores na capital fluminense. Já vi cenas muito piores. Já corri e deitei no chão por barulhos muito piores. Já vi pessoas e objetos muito mais ameaçadores. E, infelizmente, nestes mesmos termos, já perdi uma pessoa muito amada. E nem por tudo isso deixei de viver a minha cidade natal. Nem por isso nem por qualquer outra coisa, eu deixaria de andar pelo Rio como se sempre estivesse andando no quintal de casa.

Mas aqui em Sampa City a coisa não aconteceu bem assim. Não sei se é por viver sozinha aqui, por não ter o recanto seguro do colo de mãe por perto, que manda você dormir enquanto ela resolve tudo num piscar de olhos. Ou por ter sido a primeira vez que passei apuros sem ninguém pra se desesperar ou chorar junto comigo. Só sei que a coisa mexeu com a cabeça de quem vos escreve.

Sim, estou um pouco cismada com o mundo à minha volta. Andando rápido pelas ruas, colocando os documentos no bolso e o dinheiro no sutiã. Se alguém quiser levar a minha bolsa, pode levar! Só terá moedas, por que nem celular eu tenho mais! Mas não é com a perda material que eu me preocupo. Aliás, não é com o que “eles” vão levar que eu me preocupo. O que está tirando minha tranqüilidade é o susto. Sim, a possibilidade de ser abordada a qualquer momento e, conseqüentemente, o susto que eu vou tomar. Quer levar a bolsa (vazia)? Sem problemas, mas vem avisando aos poucos que sua intenção será essa, por gentileza.

Já escrevi quatro parágrafos, prometi ser direta, e cá estou sem ir ao ponto. Vou ser breve: o ponto é a desconfiança que estou criando de pessoas “diferenciadas” na rua. Não, não estou me referindo ao churrasco de Higienópolis, mas a tal “diferenciação” me parece ser a mesma a que me refiro. Agora o prezado leitor imagine eu, uma garota (não gosto de me chamar de mulher, prefiro até menina!) criada no subúrbio carioca, no pé de favela, de família que nunca teve carro, que andou o Rio de norte a sul e mais a Baixada, que no churrasco de família o que rola é pagode e itaipava, que adora futebol e suas extensões (sim, sou rubro-negra, claro!)... Imagine eu, quem voz escreve, andando em São Paulo tendo receio de qualquer gente “diferenciada”, que use bermudão e boné que venha na minha direção? Logo eu, filha de preto, com primos negões enormes (no melhor estilo MV Bill!), com primas lindas que fazem o sucesso no baile funk (sim, pelo menos duas vezes por ano, eu as acompanho!), e com uma irmã que já pertenceu assiduamente ao fã-clube do Exaltasamba (sim, eu já fui a muitos pagodes com ela!)... Eu nunca tive nenhum preconceito ou estigmatizei pessoas que compartilhem destes gostos. Não é hipocrisia! O que eu não gosto, eu não gosto. Não tenho problemas em dizer que não gosto de certos gostos do povão. Mas nunca apontei o dedo pra dizer que bandido, pivete ou ladrãozinho mequetrefe é aquele que ouve funk no celular nas alturas, que usa roupa surfwear, que tem canela seca e cara de mau. Até porque, pelo que expus aqui, estarei cortando na minha própria carne.

Sempre condenei gente (e já falei na cara de muitos deles) que acha que todo moleque pobre de comunidade está a um passo de ser bandido. E, neste sentido, também condeno as pessoas que não andam a pé pela cidade e que, portanto, preferem a segurança dos shoppings centers a uma boa tarde de compras na Rua do Ouvidor ou na Rua Teodoro Sampaio, porque nos shoppings, além do ar condicionado, ninguém é obrigado a ver gente “diferenciada”.

Mas a verdade é que, ontem, ao invés de ir ao supermercado atacadista perto de casa, que costumo ir há quatro anos, que fica literalmente no pé da favela, fui ao Carrefour, que fica dentro do shopping. A verdade é que estou assim. Mas não pretendo ficar assim. Não quero ser assim.

3 comentários:

  1. é minha querida, bem vinda ao mundo das vítimas preconceituosas rs
    E parabéns pelo blog!

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  2. Mas isso não tem que ser assim, Mabel! É o que falei: não quero ser assim! É difícil não ser preconceituosa e também não ser hipócrita! Mas há de ter um meio termo... eu espero!

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  3. Claro que nao! eh q as vezes acaba sendo consequencia. Acho que o "meio termo" que voce diz eh justamente nao dar atencao ao estilo de uma pessoa e sim `a sua intuicao com relacao a pessoa em si (isso se vc estiver com boa intuicao pq se nao estiveeeer....hahaha). Mas ao fazer isso podem te excluir das denominacoes de hipocrita e preconceituosa e na sequencia te incluir nos termos "cercada por uma bolha". Eh querida, se eu fosse voce nao me preocuparia com essas definicoes, mas sim com SEU bem estar e com o dos proximos, pq se for pra seguir padraoes..."conform or be cast out"

    Abracos querida, saudades, forca e vamo que vamo!

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